segunda-feira, novembro 08, 2004

Espero por ti

Espero por ti esta noite, só, na inépcia da minha aldeia, sob a bênção do luar luminoso. Espero por ti, sempre, fixada na porta, obcecada por ouvir o som da tua voz, contemplar o teu rosto desconhecido. Espero por ti, calma e serena, como no dia em que te conheci, em que senti o teu olhar em mim pousado. Espero ainda que me vejas, que me possas sentir, que eu te possa sentir amado. Espero por ti, desesperada, angustiada pela tua ausência, pela tua demora, pela hora que nunca mais chega.
Saudades tenho de te beijar, de te abraçar como se fosse a primeira vez, tão especial. Queria parar nesse longo abraço, perder-me na eternidade colada a ti. E no entanto, ainda estás longe, algures num lugar desconhecido, sem saberes onde estou e quando me vais encontrar, e eu a ti. Apenas a esperança de te ver, talvez de te reencontrar, talvez estejas perto, talvez sejas mesmo tu, tão simpático e discreto. Ainda é cedo para me deitar e sonhar com coisas que nunca me lembro, pesadelos até, preocupações alteradas mas implícitas na perturbação dos meus sonhos, do meu descanso sobressaltado.
Preciso de ir ter contigo, descer as escadas altas, rápido, ansiosa estou por te encontrar, por acabar de descer estas malditas escadas, dar a correr nos paralelos tortos da estrada estreita e escura, porque a noite é escura, mesmo com o progresso da iluminação pública, só ao longe me reconfortam as luzes da cidade e lá em cima o luar tão brilhante como o meu olhar na primeira vez que te vi. Ouço-te ainda longe, mais perto ou mais longe. Vagueio cansada, arrepiada com o silêncio desta melancólica noite de Verão. Deixo de te ouvir. O violoncelo que ecoa Piazzolla. Será o teu instrumento preferido? Nunca mo tinhas dito. Tão pouco sei sobre ti. Tanto que nos une e não sabemos e questionamos porquê? Finalmente percebo que és mesmo tu que fazes ecoar o violoncelo e me chamas com a tua música. Cada vez mais perto de encontrar, a esperança cada vez mais forte e o meu coração que acelera e os meus passos também. Avisto um vulto que toca num violoncelo um tango de Piazzolla, expressivo, arrepiante. Dás-me coragem para seguir em frente, para arriscar. A minha presença parece não importunar a tua interpretação, apesar de me olhares fixamente, como se me esperasses há muito, como se eu estivesse atrasada e todo o passado fosse insignificante perante este instante em que te encontro, em que te vejo e ouço o tango pelo teu violoncelo.
- Porque demoraste tanto?
- Não sabia que eras tu!
- Não sentiste que era eu?
- Senti que estavas perto.
- Porque hesitaste?
- Tive medo.
- Medo de amares e de seres amada?
- Não sei.
Espero por ti, nesta noite melancólica e triste sem ti, sem o teu calor, sem o conforto das tuas palavras. Fino e dócil, discreto e simpático, levas-me a quebrar o tabu dos meus sonhos, a saltar a barreira de todos os medos que me impediam de viver, de me sentir feliz a teu lado, feliz por te amar, livre de qualquer preconceito ou medo, perdida na realização da mais sonhada das felicidades – o amor tão puro e real. E tu estás mesmo aqui nesta noite de Verão, ao pé de mim, e não estou só, nem triste, nem carente do teu carinho, do teu abraço forte, dos teus beijos, do teu calor.

Sem comentários: