quarta-feira, agosto 30, 2006

Criação de Alberto Caeiro

«... lembrei-me um dia de fazer uma partida ao Sá-Carneiro – de inventar um poeta bucolico, de especie complicada, e apresentar-lh’o, já não me lembro como, em qualquer especie de realidade. Levei uns dias a elaborar o poeta mas nada consegui. Num dia em que finalmente desistira – foi em 8 de Março de 1914 – acerquei-me de uma commoda alta, e, tomando um papel, comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos poemas a fio, numa especie de extase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triumphal da minha vida, e nunca poderei ter outro assim. Abri com um titulo, “O Guardador de Rebanhos”. E o que se seguiu foi o apparecimento de alguem em mim, a quem dei logo o nome de Alberto Caeiro. Desculpe-me o absurdo da phrase: apparecera em mim o meu mestre.»

Fernando Pessoa

quarta-feira, agosto 09, 2006

Se alguém bater um dia à tua porta

"Se alguém bater um dia à tua porta,
Dizendo que é um emissário meu,
Não acredites, nem que seja eu;
Que o meu vaidoso orgulho não comporta
Bater sequer à porta irreal do céu.

Mas se, naturalmente, e sem ouvir
Alguém bater, fores a porta abrir
E encontrares alguém como que à espera
De ousar bater, medita um pouco. Esse era
Meu emissário e eu e o que comporta
O meu orgulho do que desespera.
Abre a quem não bater à tua porta!"

Fernando Pessoa

terça-feira, agosto 08, 2006

A nossa Herança!

Herdámos uma grande casa,
a grande casa do Mundo.
Na qual devemos conviver.

Negros, brancos,
ocidentais e orientais,
hebreus, não hebreus
católicos e protestantes,
muçulmanos e hinduístas.

Uma família que, injustamente, está dividida
por ideias, culturas e interesses.

Dado que já não podemos viver separados.
Devemos aprender a conviver em paz.

TODOS OS HABITANTES DO MUNDO SÃO VIZINHOS.


Martin Luther King

segunda-feira, agosto 07, 2006

Desabafo de um coração apertado!

Sem pressa partiu cheio de esperança e entusiasmo. Pelo caminho a vontade esmoreceu e com ela a nitidez da chegada. A cada passo o espectro da sombra de um louco a perturbar as emoções e a causar medo...

Com ele leva uma vida feita de sonhos, uma humanidade cansada e as feridas do tempo cruel. Os seus olhos, marcados pela tristeza, olham no vazio a cada passo que dá. Mil pedaços de nada preenchem o seu coração oprimido pela aridez do chão que pisa.

Lá vai, caminha desmotivado rumo a um lugar que sabe que não existe, procura uma certeza que o aprisiona por ser incerta e adormece no meio da estrada sem a vontade de acordar para retomar o caminho.

Em busca de descanso apenas, esbarra com uma vida repleta de felicidade que o procura em sonhos durante o sono.... mas ele apenas queria dormir... já lhe faltava a força para voltar a acreditar.


Esperança Martins

sexta-feira, agosto 04, 2006

Isto é mesmo divagar...

Bem, a ausência de textos meus, alguns que até parecem muito pessoais (se forem realmente sinceros), prende-se com o facto de estar concentrada no meu novo livro. Mas numa vaga poderá surgir alguma coisa... quem sabe! Depende do tempo, sempre tão incerto e escasso. Tantos planos e na prática o cansaço apodera-se de mim, aniquilando os restos de energia.

Amanhã tenho de me pôr a pé mais cedo, sabe-se lá porquê. Os sonhos e as ilusões comandam a vida. Até que se desfaçam em desilusões, até cairmos na realidade, até aterrarmos.

Amigas, nada está perdido. Acreditem que a solução está em nós mesmas. A força de que precisamos, a vontade em continuar a lutar mesmo que seja por sonhos absurdos... isso está cá dentro e ninguém nos pode tirar. E depois há a maravilhosa paisagem da natureza também humana. Um gelado delicioso, uma boas gargalhadas e tudo parece ficar bem. E fica, sem esses momentos únicos de diversão e lazer que seria da nossa vida? Uma miséria.

Sabem a liberdade é uma coisa tão... fundamental. Que prazer supera usarmos os nossos próprios neurónios? Não depender de ninguém para falar ou dar a resposta certa. Imagina se vivessemos numa ditadura. Mais frequente, numa relação ditatorial. Oh, não podias dizer nada sem que passasse primeiro na censura. Não te rias, conheço tantos exemplos. Sei bem do que estou a falar. Talvez infelizmente.

Sim, amigas, eu sei dessa treta toda e só não vos apresento estatísticas porque não vos quero desanimar. Vós não mereceis sofrer. Tendes o direito, a obrigação de lutar pelos vossos sonhos. Queria sonhar como vós, mas não consigo. A realidade aniquila esses sonhos. Resta-me um... ser feliz!

E se a liberdade me traz tanta felicidade, que valor seria superior à minha querida liberdade?
Não, desculpem mas não acredito. Neste caso sou como Tomé, só vendo... ou vivendo.

Isto tudo a propósito da minha concentração no meu livro e na falta de textos originais neste blogue... oh como não resisto a uma divagação...

E tu, devias pensar também em conquistar os outros... em geral, claro. Porque isso de estares habituado a que todos te façam a corte não te prepara para as adversidades. Um dia as coisas podem ser diferentes. Mas, sabes, tens toda a razão, há que ser rei enquanto houver monarquia, depois se vier a república tu lá arranjarás uma solução para sobreviveres. Desculpa, sou mesmo republicana por isso recuso-me a fazer-te uma vénia. E com tantos súbditos a ajoelharem-se perante ti, certamente nem te vais aperceber que preparo um golpe de estado para te tirar essas mordomias. Em último caso, se não assistir à revolução peço o exílio antes de fazeres de mim uma presa política. Ok, és um bom rei. Vaidoso mas inteligente. Devo exagerar. E a monarquia, bem lá no fundo do fundo, deve ter algo de positivo. Quem sabe se não és um novo D. Sebastião que vai surgir no nevoeiro para salvar a pátria?

Nessa nem vendo acreditaria... Há coisas que nem mesmo se as apalparmos nos parecem reais. É hora... de dormir. E também despertar para as injustiças. Oh, se este mundo fosse mesmo bom... se tipos como tu nunca chegassem a reis... se as pessoas estúpidas pensassem... e se os neurónios estivessem no coração...

Sandra Bastos

quinta-feira, agosto 03, 2006

O amor, quando se revela...

O amor, quando se revela...

O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há-de dizer.
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pra saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...


Fernando Pessoa

Quando estou só reconheço

"Quando estou só reconheço
Se por momentos me esqueço
Que existo entre outros que são
Como eu sós, salvo que estão
Alheados desde o começo.


E se sinto quanto estou
Verdadeiramente só,
Sinto-me livre mas triste.
Vou livre para onde vou,
Mas onde vou nada existe.


Creio contudo que a vida
Devidamente entendida
É toda assim, toda assim.
Por isso passo por mim
Como por cousa esquecida."

Fernando Pessoa

quarta-feira, agosto 02, 2006

Segue o teu destino

"Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.

Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.

Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam."

Ricardo Reis

Assim se escreve em bom português!!!

Preciosismos da língua
É possível que o leitor esteja a ler este artigo agora na sua cama, com a ajuda dos seus nasóculos e à luz suave de um lucivelo. Os artigos escritos pelos alvissareiros misturam-se, harmoniosamente, aos preconícios que louvam as virtudes de sortidos produtos. Está calor neste final de primavera, e decerto o nosso leitor não retira há muito tempo da sua gaveta o focale que lhe aquece o pescoço no frio. E provavelmente terá reparado como é grande, nos últimos tempos, o número de ludâmbulos que, vindos de outros Estados e até de outros países, se abalam a conhecer os encantos da cidade.


Baseado em Castro Lopes – Neologismos Indispensáveis e Barbarismos Dispensáveis